18.1.12

...sem nome




Talvez se desenhar um horizonte…

Imagino um monte, verde, seara por amadurecer, talvez. Sim, deve ser… porque se salpica de sangue em atiçadas papoilas que bamboleiam ao vento. Implacáveis sedutoras. Sinto a brisa. E o cheiro. Cheira a feno este cenário. Há também pequenas camomilas que cobrem com um perfumado manto nevado a encosta. Ouço vozes ao longe. Parecem crianças brincando mas talvez seja gente na monda. Mulheres. Mulheres jovens. Talvez isso… afastam-se e não confirmo. Fico imóvel, apenas a olhar a grande árvore. Apetece-me pendurar ali um baloiço. E pendurar-me nele em seguida. E balouçar, horas a fio, perdida do tempo. E de mim, certamente. Há um pássaro grande na árvore. Não, não é uma cegonha, que essas conheço bem. Não faço ideia do seu nome. Deve ter ninho recém feito. E crias vorazes, talvez. Quando estou assim falo sempre de coisas bucólicas...
Tenho que escrever assim, de impulso, porque não sei o que fazer com esta paisagem. Acho que a inventei apenas como refúgio da mente ou para evadir os dedos, de onde me escorre uma prosa sem morada. Acho que estou só á procura de um lugar seguro para me esconder á espera que o tempo passe. Há sol. A brisa é quente. Acho que há um mar perto… também me apetece azul.
Sento-me um pouco. É isso. Não, á sombra não, embora a árvore-mãe seja acolhedora. Mas quero sol, quero a pele quente e o abraço morno da brisa. Faltam-me braços. Falta-me a pele que se mistura em horas esquecidas. O teu sabor, amor.
Acho que aqui construía a nossa casa. Baixa, mas comprida. Com quartos bonitos para receber as nossas gentes. Estás a imaginar. Assim, tábua corrida, paredes brancas, janelas rasgadas. Apenas o essencial.
E depois fazíamos dos dias coisas fantásticas e as vinte e quatro horas seriam curtas para tantas coisas. Tantas coisas para fazer juntos, amor…
Deito a cabeça com medo que algum inseto atrevido se meta entre os cabelos mas suporto-a com o braço que dobro entre ela e o chão. Olho as nuvens. Poucas, são tão poucas. O eterno cliché de pedaços de algodão. E por algodão… não sei se gostas de algodão doce. Nunca te perguntei. Há tantas coisas que não sabemos um do outro… Mas deves gostar. És guloso.
Ah e os bolos! O cheiro a vir da cozinha e a tomar conta dos cantos da casa. Assim daqueles sem creme nem nada, sabes, só farinha, ovos, manteiga e a imaginação a juntar a gosto e a cozer em lume brando de emoção... 
Torradas! Sim, as torrdas. Aquelas que fazia pela manhã e barravamos com a compota que ainda nos escorria pelos dedos de tão fresca que estava... acordava-te assim aos beijos e era tão bom...
E depois chegava gente, muita gente, a nossa gente, e ficávamos demorados em conversas e tilintar de talheres deliciados sobre os pratos...
... as casas fizeram-se para nelas habitarem os sonhos...

8 comentários:

  1. Anónimo18.1.12

    Adorei. Muito bonito este post.

    " as casas fizeram-se para nelas habitarem os sonhos"

    ResponderEliminar
  2. Como eu adoro ler-te! :-)
    Sabes que mais...já existe gente a morar ai dentro, só estão à espera que tu lhes cries o cenário certo.
    Vais ver que assim que as situares no tempo e no local, elas começam logo a contar-te a historia delas.

    Beijo!

    ResponderEliminar
  3. J....

    obrigada, obrigada, obrigada meu querido amigo, por acreditares sempre tanto em mim...
    um beijo enorme, enorme

    ResponderEliminar
  4. aqui há MUITO TALENTO :D :D
    emocionas-me sabes?!
    um abraço redondo

    ResponderEliminar
  5. Ai estes meus amigos, estes meus amigos... A., tu és outra!
    Fico sem jeito, meninos! ;)

    ResponderEliminar
  6. MAGNÍFICO. Não só um texto a falar da Natureza, como uma verdadeira força da Natureza. Está excelente! :)

    ResponderEliminar
  7. Deixaste-me sem palavras...

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.